‘Cria cuervos que te sacarán los ojos’, por Sandro Vaia

sandrovaiaNão é preciso ter visto o filme de Carlos Saura para entender o significado da célebre expressão espanhola. O rojão na cabeça que matou o cinegrafista Santiago Andrade da TV Bandeirantes durante um distúrbio no Rio é o olho arrancado por um corvo criado, alimentado, paparicado e incentivado por boa parte do pensamento político que imagina construir uma sociedade perfeita cheia de fadas Sininho e de rios de leite e mel, onde a justiça social estará disponível nas prateleiras dos supermercados a preços de liquidação.

Não importa se o morteiro foi disparado por 150 reais. Há assassinatos mais baratos do que esse disponíveis no mercado. Importa é o caldo da cultura que criou assassinos-vítimas que aparecem com cara de Dr. Jeckyll nos seus gestos de confissão e arrependimento e são fotografados em ação no auge de sua monstruosa transfiguração de Mr. Hyde.

Se, além do curling, houvesse na olimpíada russa de inverno que transcorre em Sochi a modalidade de pisar em ovos, a imprensa, as autoridades, os políticos e o governo brasileiro criariam um escrete imbatível. Pede-se uma lei contra o terrorismo, mas terrorismo não é. E se terrorismo for, como não enquadrar os não muito amigáveis manifestantes do MST, que ocuparam a praça dos Três Poderes, tentaram invadir o prédio do Supremo e entraram em combate com policiais militares?

Mas não se pode criminalizar os movimentos sociais, reza a cartilha do poder. Por isso, prudentemente o ministro da Justiça guardou em sua gaveta um ante-projeto do secretário de segurança do Rio, Mauro Beltrame, prevendo punições para manifestações violentas. Como se não bastasse, representantes do pacífico MST, cujo líder José Pedro Stédile chamou o governo Dilma de “bundão” em questões de reforma agrária uma semana antes, foram recebidos e afagados pela própria presidente, depois de ferir 30 policiais nos choques do dia anterior. Mas se o movimento for contra a Copa do Mundo, não será mais movimento social, mas pode ser enquadrado como terrorismo, conforme um projeto de lei que está atravancado em alguma gaveta do Congresso Nacional.

A confusão conceitual se instalou na seara do politicamente correto, e os concorrentes da maratona de pisar em ovos, não sabem mais pra que lado atirar: os pobres meninos desamparados da periferia que atiram rojões a esmo são vítimas da sociedade ou da exploração de políticos inescrupulosos que pagam pela sua violência? O diabo é que todos dizem querer uma sociedade mais justa e em nome disso são capazes de pregar e acreditar que a justiça está em desmoralizar o Poder Judiciário porque condenou correligionários por corrupção ou em escrever que o “superávit primário é uma invenção diabólica do capitalismo para explorar os povos”.

Quem cria esses corvos? E os olhos de quem eles comerão?

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez e “Armênio Guedes, Sereno Guerreito da Liberdade”(editora Barcarolla). E.mail: svaia@uol.com.br

Posto publicado originalmente no Blog do Noblat

A morte e a rua, por Bruno Torturra

brunotorturraQuero falar da penúltima transmissão que fiz pela Mídia Ninja.
Foi dia 25 de julho de 2013, em um dia que ainda considero fundamental, e pouco relembrado, na inflexão da narrativa e dos caminhos que os protestos tomaram desde então.

Era para ser um ato paulistano em solidariedade aos cariocas. São Paulo adensava o coro do “Fora Cabral” e da dúvida nacional “Onde está Amarildo?”, semanas antes da comprovação de que policiais o mataram. Comecei o streaming no vão livre do MASP e segui pela Paulista sentido Paraíso. Nos primeiros 50 metros da caminhada, um impasse claro. Manifestantes pintados em verde e amarelo, exaltando o nome de Joaquim Barbosa e palavras de ordem anti-corrupção. E os Black Blocs que chegaram em peso, densos, prontos para a ação.

“Sem vandalismo!”, gritava o primeiro grupo.
“Sem moralismo!”, gritava o segundo enquanto já estouravam as primeiras vidraças de bancos e alguns relógios públicos.

Os verde-amarelos se retiraram resignados. Vi e transmiti a imagem da PM se retirando da frente de um banco Itaú para que o Black Block agisse. Assim como se retirou da Paulista como um todo. Para voltar apenas na 23 de Maio, em frente ao CCSP, quando o Black Bloc incendiava um carro da Rede Record.

Apenas uma viatura apareceu. Dois policiais militares chegaram por trás da manifestação para tentar conter o grupo que, a esse ponto, tentava virar o carro já em chamas por dentro. O Black Bloc ameaçou partir para cima dos policiais. Um deles sacou seu revólver. Manteve-o à mostra.

Eu estava entre a PM e o Black Bloc. Achei prudente sair dali, e me colocar para trás da arma sacada do policia. Foi quando, eu de costas para o Black Bloc, zuniu um paralelepípedo.
Passou a centímetros da minha cabeça antes da cair no chão. Tive a instantânea consciência de que por centímetros eu escapei de um ferimento grave, de uma sequela para a vida toda, da morte, talvez…

Até aquele dia eu tinha como regra não usar capacete. Não queria me diferenciar dos demais cidadãos, não queria me tornar um alvo preferencial de policiais que poderiam me ver como alguém “esperando bala”. Mudei de ideia.

Fiz de capacete minha última transmissão pela Mídia Ninja, no começo de agosto, em um novo protesto em que os Black Blocs protagonizaram. Mais bancos quebrados, mais bombas de gás e balas de borracha da PM disparadas a esmo. Mais acirramento e desejo de conflito de ambas as partes.

Na rua, poucos veículos de comunicação. Entre eles a BAND.
Motolinks, cinegrafistas e Fábio Pannunzio como repórter.
Na Brigadeiro Luiz Antônio, quase entrada para a Paulista, vi, do meu lado, garotos derrubando um dos motoqueiros da emissora. Poderia ter sido linchado, não fosse a intervenção pronta de outros manifestantes que os dissuadiram. Cheguei a ajudar o rapaz a se erguer e, juntos, lamentamos a violência.
Já na Paulista, fui eu o agredido verbalmente. Eu seria um petista disfarçado, a Mídia Ninja seria um projeto de alguma forma governista.

Metros adiante, novo tumulto. Um grupo de Black Blocs cercou Fábio Pannunzio e ameaçava o agredir fisicamente. Ele, calmo e articulado, dizia entender a “dívida histórica” que a grande mídia tinha com o povo. Mas ressaltava que a resposta não poderia ser agressão física, autoritarismo, uma espécie de fascismo que ele identificava na supressão da liberdade de imprensa na rua.

Junto com alguns manifestantes, ajudei a dissuadir o grupo que quase agrediu, de novo, a reportagem da BAND.
Foi meu último streaming de rua.

Nunca mais voltei a cobrir as ruas em São Paulo.
Um pouco pelo medo, pela irracionalidade de ambos os lados. Boa parte pelo gás lacrimogêneo que, a esse ponto, já me causava efeitos prolongados no agravamento da minha asma.
E muito pela falta de interesse no cenário que vi diante de mim.
A violência estava esvaziando o futuro das manifestações e acirrando discursos fora delas.
Depois veio o Roda Viva, o furacão pessoal e profissional que me distanciou ainda mais da cobertura, do tempo real, da própria demanda da Mídia Ninja. E me fez repensar alguns de meus caminhos e propósitos.

7 meses que já parecem uma vida. Mas nos quais, todo dia, me lembro daquele revólver. Daquele paralelepípedo.

A morte de Santiago Andrade é uma tragédia. Antes, e mais importante, pela morte de um homem, pai, marido, filho… A dor e o vazio que transcende política ou debates.
E, depois e secundário, tragédia pelo que representa dentro do histórico, estranho e instável processo desencadeado a partir de junho. Que começou vitorioso e exuberante ao impedir o aumento da tarifa de ônibus. E que encontra seu episódio mais triste agora, quando a tarifa, quem diria, volta a ser demanda no Rio de Janeiro.

A morte de Santiago é também uma tragédia quase anunciada. Fruto de meses de acirramento, de discursos cada vez mais simplistas e inflamados. Da inteligência que definha em um ambiente de guerra física, política, cultural. Da obsolescência do debate em prol do bate boca. Da polícia que vai se tornando milícia sem comando. Dos movimentos que vão se tornando guerrilha sem projeto. Das ideologias cristalizadas em forma de cinismo.

Manifestantes mataram um homem. Poderia ter sido a polícia. Como quase sempre, e vezes demais, foi. Poderia ter sido um policial o morto. Poderia ter sido um pedestre alheio aos protestos. Poderia ter sido um manifestante com ou sem máscara. Foi um cinegrafista. E isso também quer dizer algo.
Pois morreu alguém que estava lá não como manifestante, não como policial, nem como desavisado.
Mas como alguém cuja ofício era, bravamente, ser nossos olhos na rua.

A morte de Santiago nos faz mais cegos.

 

Visite o texto original no Facebook de Bruno Torturra

A criminalização da rabanada e a volta do macartismo

Pode parecer paradoxal, mas a primeira conquista real dos black bloc no campo ideológico é a volta do macartismo. Explico. A partir de uma vaquinha (as do PT para os mensaleiros são muito mais substanciosas) para custear uma ceia de natal, parte da imprensa e da opinião pública já concluiu que os BBs são financiados por “vereadores do PSOL, juízes e delegados de polícia”.

Vencidos ou vencedores ?

Vamos aos fatos. Ninguém vai promover a destruição Estado, do capitalismo, da mídia burguesa-corporativa e o fim da polícia militar lançando rabanadas durante manifestações natalinas de protesto. Parece muito mais razoável e verossímil aceitar que, entre um quebra-quebra e outro, os black blocs do Ocupa Câmara promoveram efetivamente uma confraternização para moradores de rua. Ou você acredita nessa conversa fiada de revolução da rabanada ?

Agora vamos pelo outro lado. O sujeito está em seu gabinete quando toca o telefone. Na linha está Sininho, a black bloc. Ela diz que vai fazer uma ceia de natal e pede uma doação. Se você fosse o político procurado, doaria ou não o dinheiro ?

Eu doaria, ainda que fosse inimigo visceral da causa que eles representam. Duzentos ou trezentos reais podem representar a diferença entre granjear alguma simpatia ou colher a antipatia de quem joga pedras, taca coquetéis molotov e esmurra inimigos ideológicos. E aí, é um bom negócio ou não ? Se a sua resposta é ‘não’, significa apenas que você nunca esteve no fogo cruzado de uma manifestação violenta. Só isso.

Há um outro aspecto muito importante nas denúncias patrocinadas pelo advogado Jonas Tadeu. É o que trata do aliciamento de baderneiros para infundir o terror durante as manifestações. É fato que os black bloc ‘aliciam’ arruaceiros. Mas dou minha cara a bater se alguém provar que a coleta dessas almas é feita com dinheiro, quentinhas e ônibus para o transporte do lumpezinato de aluguel.

Não faz nenhum sentido, a não ser para os analfabetos políticos ou para ou para os mal-intencionados, afirmar que anarquistas podem se valer das mais nefastas práticas capitalistas para montar o exército que vai combater o próprio capitalismo.

Mas faz muito sentido suspeitar que o quebra-quebra e o pânico disseminado durante as batalhas campais interessam a alguns políticos inescrupulosos. Mais do que verossímil, é lícito supor que gente como Antony Garotinho, cujos bate-paus de palanque foram fotografados entre os black blocs, esteja financiando a amplificação da baderna para levar o caos ao Rio de Janeiro. Ao final das investigações, é bem provável que isso fique patente. É esperar para ver.

É provável que os jovens que usam máscaras só venham a entender como foram utilizados pela esperteza dos políticos quando tudo isso restar comprovado. Até lá, no entanto,  vão colher muitas derrotas com a sua tática de ‘ações diretas’ de depredação e desafio à autoridade do Estado. Derrotas que todos os brasileiros vão ser obrigados a dividir com eles.

A começar pelo estreitamento da nossa democracia com a promulgação iminente de leis contra o terrorismo. Elas virão aí, certamente, porque a sociedade está a exigí-las. E vão impor penas severíssimas, criminalizando comportamentos que durante 30 anos foram acolhidos pela nossa jovem democracia.

É uma pena. Mas a estupidez e a demência desses don quixotes anarquistas não vão tornar o País melhor nem mais livre, ainda que venham a torná-lo mais seguro para quem tem uma causa por que protestar.

Deus me livre de um advogado desse!…

jonasandradeImagine a cena.O sujeito sabe que fez uma grande merda e está apavorado. Reconhece a tatuagem da própria panturrilha nas imagens do Programa do Datena.

As imagens se repetem uma duas, dez vezes. Agora estão também no Marcelo Rezende. Ele está a um passo de se tornar o inimigo púbico número um. Tem medo de sair à rua. Decide que precisa apresentar espontaneamente à polícia uma versão verossímil para tentar se livrar da co-autoria de um crime gravíssimo.

(Aqui há um hiato na história. Surge, não sei como,  o advogado Jonas Tadeu Nunes. É um hiato importante. Diz o jornal O Globo que foi o pai do garoto quem contratou.)

Fábio Raposo comparece sozinho à delegacia de São Cristóvão. Presta um declarações muito bem orientadas, assim transcritas em matéria do G1: “Só estou vindo aqui mesmo porque estou assustado demais. A minha foto foi divulgada até em mídias internacionais. Já recebi ligações de pessoas desconhecidas, não sei se são grupos ou o que são, pedindo para eu assumir o caso e falar que fui eu, tentando me obrigar”.

Não há, até esse momento, registro público da presença de advogado ao lado dele. Fábio Raposo, ou Fox, termina indicado.

Na manhã seguinte, o black bloc é preso na casa da mãe. Jonas Tadeu  surge então como patrono de Fábio Raposo. Fala em delação premiada. Escancara a culpa do cliente. Tudo o que o advogado consegue é equiparar a situação dois dois acusados.

(Aqui volto àquele hiato importante. Como não sei o que houve, imagino que a conversa entre consituído e constituinte foi a… seguinte:

– Mas dotô, eu não posso lhe pagar os honorários.

– Eu trabalho por paixão, não vou lhe cobrar nada!

– Ôxe, mano. Eu sou espada!

– Por amor à profissão, moleque!

– Ah, bom! E o que é que o senhor tá achando aí da situação ?

– Tá bem enrolada. Mas pra quem cuidou do Natalino, vai ser moleza.

– Natalino ?

– É um cliente antigo.

– O senhor também fez a defesa dele de graça ?

Saio do hiato.)

A versão de Fábio Raposo segue a lógica de Madame Satã (“A bala fez o buraco, quem matou foi Deus”). Teria “encontrado”o rojão no chão e “passado” para o outro rapaz, um desconhecido. Embalada em um discurso de todo aviãozinho do tráfico apanhado com drogas no bolso da bermuda: “achei no chão”.

Do nada, o estagiário do advogado aparece com um termo de declarações na mão dando conta de uma história surreal. A líder máxima dos mascarados teria ligado em nome do deputado Marcelo Freixo oferecendo pencas de advogados do PSOL para tirar os assassinos da cadeia.

O advogado fica indignado. “Manda dizer pra esse Freixo que aqui não precisa de advogado não”. Mas é Freixo quem fica possesso. Declara-se contra a violência e os violentos. Freixo é um político com cara de anti-político. Ele sabe que muitos desse celerados são seus eleitores. Deve ter perdido alguns votos.

Jonas Tadeu se transforma no grande pauteiro da imprensa. Com a polêmica com Freixo ainda quente,  saca do bolso do colete o nome do rapaz que lançou o rojão. Mais e mais manchetes. Jonas, o advogado, se transforma  também na sensação do jornalismo em tempo real.

Cai a noite, vem a madrugada e o onipresente causídico reaparece como um pesadelo no plantão das redações. Está no interior da Bahia com uma equipe de policiais. O homem que lançou o rojão, Caio de Souza, é preso numa pensão. Quando as algemas lhe são colocadas no pulso, Jonas Tadeu já é formalmente seu advogado.

O advogado foi com a polícia prender o acusado. No instante seguinte passa de perseguidor a procurador.

Entre uma aparição e outra, Jonas Tadeu trabalha também como assessor de imprensa. Seleciona repórteres de maneira a obter mais e mais exposição a cada “novidade”. Os da Globo são seus ‘alvos’ prediletos. A eles, confia o segredo sobre o destino de Caio. Uma equipe da emissora embarcou junto com ele para Feira de Santana. O termo de declarações foi dado a outra repórter. De presente.

A Band, vítima da tragédia, também é aquinhoada. Ganha do advogado a oportunidade de entrevistar por dois minutos Caio de Souza. Os índios também ganham  um espelhinho.

Vem a noite. De entrevista em entrevista, Jonas Tadeu vai complicando a a situação de seus próprios clientes. Acrescenta que black blocs são aliciados por políticos cariocas. O cliente dele teria recebido 150 reais para participar do quebra-quebra.

Já não são apenas os repórteres. Os políticos de oposição também estão em polvorosa. O que o advogado diz rapidamente se transforma em notícia.

Se é fato ou não, se é apenas estratégia de defesa, apura-se depois.

O idiota

 Veja só onde a insanidade pode levar um idiota.

Para fazer troça de William Boner e vingar-se de sua secular demissão da Rede Globo, Paulo Henrique Amorim produziu o registro aí embaixo.

Se fosse um sujeito qualquer, seria o caso de se indagar por que alguém se expõe desse jeito. Mas é PHA, e não justifica a indagação.

Um desembargador, no corpo de um acórdão, disse que ele tem senilidade. Deve ser verdade. 

Não fosse por isso, seria simplesmente desrespeitoso e ultrajante, especialmente porque o cadáver de Santiago Andrade ainda não havia sequer chegado ao crematório.

Veja com seus próprios olhos. É simplesmente inacreditável!

Atenção black blocs: a mídia vai pegar vocês!

bbcarro

O texto aí embaixo foi copiado da página black bloc no Rio de Janeiro. O que ele afirma é grave e sintomático: os degenerados mascarados definitivamente elegeram a ‘mídia’ como o inimigo a ser combatido. A mensagem nem precisava ser tão contundente. O assassinato de Santiago Andrade fala muito mais alto, posto que o objetivo é estabelecer a tática (o combate aos jornalistas) e difundir o terror.

O ânimo entre os da ‘mídia’ com quem os black bloc têm  contato físico —  os repórteres, cinegrafistas e fotógrafos — não poderia ser pior. Na porta da delegacia de São Cistóvão, no Rio de Janeiro, de onde os mascarados não  ousam se aproximar há 72 horas, profissionais da imprensa se dizem dispostos a aceitar provocações e devolver as ofensas agravadas.

Foi assim quando uma imbecil conhecida como Sininho apareceu com dois outros beócios para chamar os repórteres de “carniceiros” e ameaçá-los de morte. O animal que fez as ameaças, um desocupado chamado Ian, foi devidamente repelido por um cinegrafista da Band, que deu-lhe com a câmera na cabeça.

Ontem, terça-feira, houve pelo menos dois episódios que quase geraram atritos físicos. Ambos aconteceram porque os repórteres desconfiaram de elementos estranhos ao time da ‘mídia’ que fotografavam os colegas. Os cinegrafistas e fotógrafos se juntaram e repeliram os estranhos, mandando-os para o outro lado da calçada. Ninguém se opôs a isso que, a rigor, é também um ato de força.

Em suma, os repórteres se cansaram de apanhar. O que muda radicalmente a disposição de não reagir e a orientação de se esquivar das provocações. Temo que os jornalistas, quando estiverem agrupados, tendam a agir exatamente como agem os mascarados caso venham a ser acuados. A morte de Santiago demarcou o fim de uma curta era: aquela em que os black bloc promoviam cenas de barbárie para a imprensa registrar e de quebra ainda ainda batiam nos profissionais escalados para a cobertura.

Não concordo com o uso da violência, mas compreendo as razões que levaram meus colegas à exasperação. Tristes com a morte de um companheiro querido e admirado,  entenderam finalmente que a eliminação física dos jornalistas é efetivamente o que deseja essa agremiação fascista que tapa o rosto para ir às ruas. Agora, estão dispostos a se defender para não perecer, como ocorreu com Santiago.

Não vai adiantar nada sair por aí espancando black blocs. Nós, jornalistas, não fomos treinados para o vale-tudo que transformou ruas em octógonos e jovens altivos em protótipos de terroristas desesperançados. Nossa arma é muito mais poderosa e eloquente dos que os músculos, os socos-ingleses, as pedras e os porretes. Temos nossas canetas, as câmeras e as máquinas fotográficas.

E, para o desespero dos nossos inimigos autoproclamados, o ‘sistema’ está do nosso lado. Temos as leis, a Justiça e, em último caso, também a polícia para defender a nossa integridade, embora isso nem sempre fique evidente. Temos o Ministério Público, os juízes e os delegados de polícia. Somos os representantes da ‘ordem’ no processo entrópico que o niilismo dos mascarados pretende instaurar.

Foi graças a essas armas — câmeras, principalmente — que a ‘mídia’ conseguiu, em tempo recorde, identificar e botar atrás das grades os dois assassinos de Santiago Andrade. Não foi preciso disparar um rojão, assassinar alguém, atirar uma pedra sequer para neutralizar os covardes. O Estado movimentou sua máquina.

E assim será em cada caso, cada agressão.  A cada pancada, a cada ato de coação, lá estaremos nós com as nossas lentes e canetas. Vamos denunciar a violência dos black bloc com o mesmo rigor que denunciamos a violência policial. É o nosso papel que nos protege, não nossa força física. Nós, jornalistas, somos o sistema, para o desespero dos que pretendem nos eliminar.

Vamos pegar os black blocs.

Com as nossas armas, não com as deles.

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Santiago

Santiago AndradeQuero dar meus pêsames à família do Santiago Andrade. Tive o prazer de trabalhar com ele algumas vezes e sei que era um companheiro muito querido e respeitado. Todos os meus colegas aqui no Rio de Janeiro estão consternados com a tragédia que o abateu. Muito tristes mesmo com sua perda precoce.

A tragédia era favas contadas. Desde meados de junho, quando os mascarados surgiram e passaram a sequestrar manifestações de protesto de terceiros, os sentimentos que nutrem pelos  jornalistas só encontram paralelo no ódio que eles devotam à polícia.

Carros de reportagem foram virados e queimados. Repórteres foram cercados e intimidados fisicamente. Isso aconteceu comigo mesmo no dia 30 de junho. Jogaram vinagre nos olhos da doce Rita Lisauskas para sabotar uma entrada ao vivo. Expulsaram o Caco Barcellos de uma praça pública. Depredaram a Globo. Fizeram o diabo.

Agora, morreu o Santiago. Mataram o Santiago.

Os balck bloc produziram a primeira vítima fatal da guerra que tanto desejaram. A guerra que os fez repetir exaustivamente o mantra moral pusilânime de  que “não pode haver revolução sem vítimas”.

E agora, o que vão fazer com isso ?

Não vão fazer nada além de produzir órfãos e tristeza. E delinquência comum, chula, irresponsável, banal.

Para quem se pretendia herói até a semana passada, não deve haver pejo pior do que o rótulo de assassino.

 

Muita fumaça e pouco fogo, por Nelson Motta

marijuana

Nelson Motta, O Globo, no Blog do Noblat

Em Barcelona, já são mais de 400 clubes legalizados, onde a inscrição custa dez euros e o sócio pode comprar até 80 gramas por mês de diversas qualidades de maconhas orgânicas, produzidas por pequenos agricultores autorizados.

Está ficando banal, todo dia se tem noticia de mais um lugar em que o tabu está sendo quebrado, além dos 20 estados americanos que já permitem o “uso medicinal” e dos dois que liberaram geral, da estatização no Uruguai, da bem-sucedida descriminalização portuguesa…

Mudou muita coisa e, ao mesmo tempo, não mudou nada na vida desses lugares e de seus cidadãos. As pessoas não estão saindo enlouquecidas pelas ruas, não há hordas de doidões invadindo lanchonetes em busca de laricas, os funcionários não estão dormindo nos escritórios, a criminalidade e a violência nem aumentaram e nem diminuíram, as famílias não estão se sentindo ameaçadas, a polícia tem mais o que fazer do que perseguir cidadãos honestos e pacíficos que gostam de fumar um baseado.

Um golpe mortal no tráfico e no crime organizado? Nem chapado alguém pode acreditar nisso. O tráfico de verdade, o definitivo e invencível, faz fortunas e milhares de mortos com cocaína, crack, heroína, ecstasy e uma infinidade de novas drogas sintéticas e quase invisíveis, que dão muito mais lucro com muito menos risco do que a volumosa e olorosa maconha.

Diante do mercado milionário de analgésicos tarja preta, que já tem seis milhões de dependentes nos Estados Unidos, o tráfico de marijuana virou coisa de pobre, do passado.

O mais triste é pensar nos trilhões de dólares torrados, no tempo, no trabalho e nas vidas perdidas, nas incontáveis pessoas de bem que sofreram o diabo nas cadeias por alguns baseados, nos que se tornaram bandidos e marginais, na trágica inutilidade de tudo isso. Tanto barulho por nada, por um bagulho.

Enquanto isso, no Brasil, onde os consumidores dizem que se fuma uma das piores e mais caras maconhas do mundo, produzida no Paraguai e distribuída pelas facções do crime organizado, o governo e o Congresso vão enrolando, a polícia vai apertando e continuamos queimando tempo e dinheiro.

Diante do mercado milionário de analgésicos tarja preta, que já tem seis milhões de dependentes nos Estados Unidos, o tráfico de marijuana virou coisa de pobre.

via Muita fumaça e pouco fogo, por Nelson Motta – Ricardo Noblat: O Globo.

Tucanos na gaiola

 

 
tucanoengaiolado Vinte e dois anos em regime fechado, multa de R$ 2,2 milhões. E tudo isso para o deputado, ex-senador, ex-governador, ex-presidente do PSDB Eduardo Azeredo.

O que ele fez ? A mesma coisa que já mandou um bando de petistas para uma penitenciária. Com o mérito pelo advento do esquema urdido por Marcos Valério.

Eduardo Azeredo, no caso do Mensalão tucano, cumpriu papel análogo ao de José Dirceu no Mensalão do PT, de acordo com  a peça produzida pelo Procurador-geral Rodrigo Janot.

Se o julgamento for rápido, Azeredo ainda terá o prazer e o privilégio de gozar da companhia de seus colegas petistas nas longas noites da Papuda.

Cadê o passaporte brasileiro do morto-vivo do PT ?

fantasma

Fingindo-se de morto.

Foi assim que Henrique Pizzolato preparou adredemente seu plano de fuga ainda na aurora do Mensalão, quando só ele imaginava que um gatuno do PT, desses que abundavam na Esplanda, poderia sair-se preso em plena gestão petista.

Para dar consequência ao plano, Pizzolato precisava de um morto. Servia o irmão Celso mesmo,  enterrado há 35 anos e “ressuscitado” juridicamente em 2008.

Não tem tu, vai tu mesmo.

Enquanto o julgamento avançava, Celso levantou da sepultura, votou, tirou documentos. Atualizou seu cadastro na Receita. Pagou impostos. E, ao final, teve sua fantasmagórica existência formal reconhecida pelos governos brasilerio e  italiano.

Mas para enganar dois países uma formalidade teria que ser obrigatoriamente cumprida: apresentar um passaporte brasileiro válido ao Consulado Italiano. Sem isso, nada de passaporte italiano em nome de Celso Pizzolto.

É assim que funciona a expedição do documento. Leva-se o passaporte emitido pelo governo brasileiro ao consulado. Lá ele é conferido, fotocopiado e arquivado. Só depois é expedido o documento pelo país europeu. Assim, o morto-vivo petista precisa necessariamente ter consigo um passaporte brasileiro em nome do irmão morto-morto.

Quem emite o passaporte brasileiro ? A Polícia Federal. Portanto, Pizzolato teve a cara-de-pau de ir ter com os agentes federais ao construir sua estratégia de fuga para o futuro. A mesma PF que agora tem como missão recompor a saga do morto-vivo do PT.

Até agora falou-se de tudo. Do gênio precavido do mundo do crime, do itinerário de sua viagem, dos estratagemas utilizados para a fuga.

Menos sobre como Pizzolato, o espertíssimo capopetraglia’, o ícone dos jabazeiros da BESTA, enganou a Polícia Federal.

Há muito que falar ainda sobre Henrique Pizzolato. Mas o olé na PF, esta talvez seja a parte mais difícil das explicações posteriores.